Em uma decisão que provoca uma reviravolta no processo, a Justiça de São Paulo rejeitou a denúncia de corrupção passiva contra o auditor fiscal de Rendas Jorge David Júnior, da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefaz SP). O auditor havia sido preso em flagrante, acusado de receber propina. A juíza Gisele de Castro Catapano, da 1ª Vara Criminal de Osasco, considerou que o flagrante foi ilegal.
“A nulidade é absoluta e insanável, impondo a rejeição da inicial acusatória por ausência de justa causa, uma vez que desprovida de qualquer elemento informativo lícito que a sustente”, diz a decisão.
O flagrante foi planejado após o empresário Márcio Petito procurar o Ministério Público para relatar que o auditor teria exigido R$ 20 mil para engavetar uma denúncia contra ele por suposta lavagem de dinheiro. Promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), em conjunto com a Polícia Civil, realizaram uma ação controlada. Agentes fotografaram as cédulas que seriam entregues ao auditor para registrar o número de série.
David Júnior foi preso em flagrante em 30 de maio de 2023 no posto oficial da Fazenda de Osasco. A quantia de R$ 5 mil, correspondente à primeira de quatro parcelas da propina, estava em sua mochila, segundo a denúncia.
AÇÃO CONTROLADA
A juíza Gisele de Castro Catapano afirmou que, por se tratar de uma ação controlada, e não de um ato espontâneo de policiamento ostensivo, o Ministério Público deveria ter pedido autorização judicial antes de agir. O órgão, por sua vez, alega que a situação era urgente.
“A realização de ação controlada sem autorização judicial é, portanto, um ato ilegal. Consequentemente, todas as provas obtidas a partir dessa operação são ilícitas, por contaminação direta. A prisão em flagrante, a apreensão do dinheiro e os depoimentos dos policiais que participaram da diligência ‘são frutos da árvore envenenada’, imprestáveis para fundamentar qualquer ato processual, notadamente o processamento de uma denúncia“, justificou a magistrada.
Para a juíza, também houve uma “quebra da cadeia de custódia das provas“, ou seja, falhas que, na avaliação dela, comprometeram a confiabilidade da investigação. Gisele afirma em sua decisão que, embora as cédulas tenham sido previamente marcadas, “o encontro destas não foi documentado, faltando elemento essencial para estabelecer o nexo de identidade do vestígio“.
“A prova material – a correspondência entre o dinheiro preparado e o dinheiro apreendido – mostra-se não documentada, o que a fragiliza. As fotografias das cédulas que foram apreendidas com Jorge David, que comprovariam a marcação prévia, nunca foram acostadas aos autos“, destacou a magistrada.
A decisão cria uma reviravolta no processo. A denúncia já havia sido recebida por outra juíza, em outubro de 2023, e a ação criminal estava na fase de instrução. Em junho de 2024, Ana Paula Mezher Mattar, da 2ª Vara Criminal de Osasco, que conduzia inicialmente o processo, declarou-se suspeita por “motivo de foro íntimo”. Com a mudança, a juíza Gisele, a nova responsável pelo caso, decidiu em sentido totalmente contrário. O Ministério Público pode recorrer da decisão.