O juiz Gerfran Carneiro Moreira, da 4ª Vara do Trabalho de Manaus, indeferiu o pedido de uma advogada para que uma audiência presencial fosse realizada de forma telepresencial. Em sua decisão, proferida na tarde de terça-feira (24), véspera da audiência, o magistrado citou a música “Pega o Guanabara”, sucesso na voz de Wesley Safadão, em referência à dificuldade logística da defensora, que atua em outro estado.
A canção, que aborda o amor à distância e tem em seu título o nome de uma empresa de ônibus, inspirou a adaptação do julgador: “Em se tratando de Manaus, onde se lê Guanabara, pode ser Azul, Gol ou Latam“, escreveu o juiz.
O requerimento de mudança do formato da audiência foi feito pela defesa da parte reclamada em uma ação trabalhista contra um hipermercado, cujo valor da causa é de R$ 120,7 mil. A advogada invocou a Resolução 354/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que elenca hipóteses para a realização de atos processuais online.
DEFESA DA PRESENCIALIDADE
Inicialmente, o juiz Moreira observou que já havia decidido pela audiência presencial em 1º de abril. Dessa forma, o pedido da parte se reveste de um status de reconsideração, admissível apenas em situação extraordinária, o que, segundo ele, não foi verificada no caso. O magistrado destacou que não “redecide” o que já decidiu, salvo se os fatos mudam, conforme dispõe o artigo 505 do Código de Processo Civil (CPC).
Quanto à resolução do CNJ, o julgador contextualizou que ela foi editada em novembro de 2020, em meio à pandemia da Covid-19, para dar alguma normalidade à prestação jurisdicional em razão das medidas de distanciamento social. Contudo, a situação daquela época não mais perdura.
“O ‘normal’ não é juízes e advogados estarem separados por telas, cada um num lugar do mundo. A vida do Direito é como o amor: pode até acontecer a distância, vez ou outra, mas só se consuma no calor da proximidade, no corpo a corpo, nas conjunções das inteligências, das almas e — no caso do amor — das carnes“, analisou Moreira.
Segundo ele, o juiz só pode determinar audiência telepresencial de ofício em casos específicos, pois a regra é a presencialidade. Na hipótese sob apreciação, ele ponderou que as partes precisam discutir temas que abrangem matéria de fato e têm prova testemunhal para produzir. “A experiência forense indica que a audiência, com esses aspectos, só se perfaz bem com segurança e confiabilidade no ‘ao vivo’.”
O juiz acrescentou que a Resolução 354/2020 e o Estatuto da Advocacia não preveem a prerrogativa de advogados elegerem o lugar da audiência e a sua forma. Ele alertou que, “se a parte escolhe um advogado não residente na comarca, deve assumir os ônus disso“, pois o modelo presencial é a possibilidade “real e normal” em todas as ações.