O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desistiu nesta quarta-feira (24) de enviar técnicos para acompanhar as eleições na Venezuela após o ditador Nicolás Maduro questionar, sem provas, o sistema eleitoral do Brasil. Trata-se de mais um atrito entre autoridades brasileiras e a ditadura, cujas relações têm se deteriorado nos últimos meses.
Maduro afirmou, em comício na noite de terça-feira (23), que as eleições no Brasil, Estados Unidos e Colômbia não são auditadas. Ele disse ainda que o “o melhor sistema eleitoral do mundo” é o venezuelano.
“Em face de falsas declarações contra as urnas eletrônicas brasileiras que, ao contrário do que afirmado por autoridades venezuelanas, são auditáveis e seguras, o Tribunal Superior Eleitoral não enviará técnicos para atender convite feito pela Comissão Nacional Eleitoral daquele país e acompanhar o pleito do próximo domingo”, disse o TSE em nota divulgada na noite desta quarta.
“A Justiça Eleitoral brasileira não admite que, interna ou externamente, por declarações ou atos desrespeitosos à lisura do processo eleitoral brasileiro, desqualifiquem-se com mentiras a seriedade e a integridade das eleições e das urnas eletrônicas no Brasil”, afirmou ainda o tribunal.
O Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela havia feito ao TSE um convite para que dois técnicos acompanhassem as eleições do país, marcadas para o próximo domingo (28).
O TSE chegou a recusar o convite e disse que focava as eleições municipais brasileiras de outubro. Em julho, o tribunal presidido pela ministra Cármen Lúcia recuou e aceitou enviar dois servidores na condição de convidados internacionais do CNE.
Ao anunciar a nova mudança de postura, o TSE chamou de mentirosas as declarações contrárias ao sistema eletrônico de votação adotado no Brasil.
“Afirmar mentira sobre a confiabilidade da urna eletrônica brasileira, que —reitere-se— é auditável e segura, é semear inaceitável afronta à seriedade, à segurança e à publicidade plena do processo eleitoral do Brasil, levado a efeito com integridade, austeridade e eficiência para o fortalecimento contínuo da democracia”, disse o tribunal.
A decisão do TSE representa mais um atrito entre autoridades brasileiras e o regime da Venezuela. Isso porque o ataque de Maduro ao sistema brasileiro ocorreu um dia depois de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmar que estava assustado com declarações do venezuelano sobre um “banho de sangue” caso ele seja derrotado nas eleições.
“Fiquei assustado com as declarações […]. Quem perde as eleições toma um banho de votos, não de sangue. Maduro tem de aprender: quando você ganha, você fica. Quando você perde, você vai embora e se prepara para disputar outra eleição”, disse o petista em uma entrevista a agências internacionais na última segunda (22).
O governo Lula mudou de tom em relação à ditadura em março passado, quando criticou pela primeira vez o bloqueio à candidatura da opositora Corina Yoris, nome que havia sido escolhido pela principal força de oposição contra o chavismo nas eleições presidenciais.
Em nota divulgada na ocasião, o Itamaraty disse que “acompanhava com expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral” na Venezuela, marcando uma inflexão na postura até então adotada por Lula em relação ao regime do ditador Nicolás Maduro, de preservar o aliado sul-americano.
Nesta quarta, depois de questionar o sistema eleitoral brasileiro, Maduro voltou a provocar Lula, mencionando o Brasil durante uma entrevista coletiva. “Temos fronteiras e boas relações com Colômbia, Brasil e o resto do Caribe. Boas relações, ou seja, ninguém deve se meter nos assuntos internos da Venezuela, porque nós não nos metemos nos assuntos internos de ninguém”, disse Maduro.
O ditador também disse que, no Brasil, “não auditam nenhuma ata”. No Brasil, o boletim de urna é um comprovante impresso emitido pela urna ao final da votação, com um resumo do que foi registrado. Ele permite que as pessoas (e partidos) confiram o resultado imediatamente após a eleição e também possibilita auditar que tanto a transmissão quanto a totalização dos votos ocorreram corretamente.
O pleito venezuelano é visto com especial atenção na região porque pode representar o fim de dez anos do regime de Maduro e também do chavismo, há 25 anos no poder na Venezuela desde a ascensão, em 1999, de Hugo Chávez (1954-2013).
Com informações da FolhaPress