A Justiça Federal determinou a suspensão de vídeos em canais de YouTube mantidos por policiais. A decisão visa a programas de entrevista onde agentes de segurança pública relatam suas experiências em operações. A medida, de caráter provisório, tem como objetivo impedir a disseminação de discursos de ódio.
A decisão judicial atende a uma ação civil pública promovida pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Defensoria Pública da União (DPU). Foram afetados os canais “Copcast”, “Fala Glauber”, “Café com a Polícia” e “Danilsosnider”.
Conforme o despacho, os vídeos serão temporariamente suspensos, mas não excluídos, para preservar o equilíbrio entre a proteção dos direitos humanos e a liberdade de expressão e atividade econômica dos canais, permitindo reversão da medida até decisão final.
“O resultado é crucial para mostrar que esses discursos representam um abuso da liberdade de expressão, exaltando a violência policial e direcionando essa violência a grupos sociais específicos, como a população negra e moradores de favelas. É uma sinalização importante para prevenir a repetição desses discursos”, comentou o procurador da República Júlio Araújo ao UOL.
A Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro também foi notificada para esclarecer os procedimentos adotados para controle das postagens nas redes sociais.
A ação iniciou-se após uma apuração interna do MPF-RJ, aberta em 17 de abril de 2023, sobre os conteúdos dos canais. Os vídeos sob investigação incluem narrativas de abusos policiais cometidos no Rio de Janeiro e São Paulo. Em seus relatos, os policiais discutem abertamente o encobrimento e o estímulo de ações violentas, inclusive mortes, por parte da polícia.
Após a divulgação dos vídeos em uma reportagem do site Ponte Jornalismo, MPF e DPU requisitaram ao Google, controlador do YouTube, informações sobre a moderação desses conteúdos. Os canais, que somam de 200 mil a 1,6 milhão de inscritos, têm alguns vídeos no ar há mais de uma década.
Um dos vídeos em destaque traz uma entrevista com Miquéias Arcenio, ex-assessor do vereador cassado Gabriel Monteiro e PM licenciado no Rio de Janeiro. Na entrevista, Arcenio descreve ações violentas do Bope sem registro oficial. Ele cita um exemplo em uma operação no Complexo do Alemão, na favela Nova Brasília, que resultou em sete mortes.
“O Bope, quando quer, ‘mata os outros na faca mesmo’, mas oficialmente isso não existe”, afirmou Arcenio na entrevista, publicada em 4 de setembro de 2022, acrescentando que os agentes do Bope mudam de uniforme para realizar ações violentas sem levantar suspeitas.
A suspensão dos vídeos reflete a crescente preocupação com o uso das redes sociais para divulgar conteúdos que exaltam a violência, com implicações significativas para a regulamentação da liberdade de expressão na era digital.