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7 DE SETEMBRO: Independência ou morte

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Artigo originalmente publicado na Folha de São Paulo

Contam os historiadores que o príncipe regente do Brasil, Dom Pedro de Alcântara, deslocando-se a cavalo do Rio de Janeiro para São Paulo, acompanhado de sua comitiva, recebeu na entrada desta cidade, às margens do córrego Ipiranga, algumas mensagens vindas de além-mar encaminhadas por sua esposa, a princesa Maria Leopoldina, dando conta de que as cortes portuguesas exigiam o cerceamento das modestas franquias desfrutadas pelos brasileiros e o seu imediato retorno para Lisboa.

Inconformado, sem apear da montaria, o impetuoso filho do rei de Portugal, Dom João 6º, desembainhou a espada, juntamente com seus companheiros de viagem, e proferiu o brado que reverbera até os dias de hoje: “Independência ou Morte”. Era o dia 7 de setembro de 1822.

Esse gesto, imortalizado num conhecido quadro pintado por Pedro Américo, desperta, porém, uma interessante questão: foi o Brasil —como se costuma dizer— que ficou independente? Em outras palavras, foi o Estado que se livrou do jugo metropolitano? A resposta é claramente negativa, pois este último somente nasceu oficialmente com a fundação do Império por obra da Constituição promulgada em 25 de março de 1824.

Assim, não foi o Estado que se emancipou em 1822, mas, sim, a nação brasileira, ainda em formação, é verdade, integrada por portugueses e seus descendentes, negros, mulatos, curibocas e caboclos, em cujo nome o príncipe declarou a Independência, embora sem o dizer explicitamente. Somavam à época cerca de 3 milhões de pessoas que, nas palavras de Darcy Ribeiro, resultando de “matrizes raciais díspares, tradições culturais distintas, formações sociais defasadas se enfrentam e se fundem para dar lugar a um povo novo, num novo modelo de estruturação societária”.

Foram precisamente os filhos e as filhas desse povo que empunharam armas e derramaram seu sangue para derrotar as tropas portuguesas aquarteladas em solo brasileiro, revelando heróis e heroínas de extração popular, aos quais se deve a consolidação da Independência, a exemplo de João Francisco de Oliveira, o “João das Botas”, e de Maria Quitéria, primeira mulher a assentar praça numa unidade militar.
Com inspiração nessas lutas e nos ideais libertários então em voga no mundo, a primeira Constituição imperial assegurou aos cidadãos brasileiros “a inviolabilidade dos direitos civis e políticos”, generosamente enumerados nos incisos do art. 179.

Não obstante, Dom Pedro, deslembrado do juramento que fez de fielmente cumprir o que nela se continha, teve de abdicar do trono, no dia 7 de abril de 1831, em favor de seu filho, ainda menor de idade, pressionado pelo próprio povo que, num passado ainda recente, em 12 de outubro de 1822, o havia aclamado, em praça pública, imperador e defensor perpétuo do Brasil.

Dessa saga memorável decorre que a ninguém é lícito apropriar-se da data de nossa Independência com fins político-partidários, muito menos com o propósito de dividir os brasileiros, definitivamente vocacionados para a fraternidade, porquanto ela pertence ao povo, não aos governantes eleitos para representá-lo temporariamente, aos quais cabe, tão somente, rememorá-la a cada ano, de forma condigna e respeitosa, para celebrar o triunfo da liberdade sobre a servidão e o despotismo.

Ricardo Lewandowski, ministro do Supremo Tribunal Federal e professor titular de teoria do Estado da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

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