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OPINIÃO

Honorários advocatícios: aos fatos. Um resgate à verdade

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Na era das fake news, até mesmo temas técnicos e juridicamente consolidados acabam reféns da desinformação. Recente polêmica criada em torno da percepção de honorários advocatícios por membros da advocacia pública, apresentados em certas reportagens como um privilégio suspeito ou um “penduricalho” indevido, bem exemplifica o ponto. Trata-se de uma distorção frontal da realidade normativa, jurisprudencial e institucional brasileira.

A percepção de honorários pelos advogados públicos — prevista expressamente na Lei 13.327/2016 no âmbito federal, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 6053) e acompanhada com ferocidade por órgãos de controle como o TCU — é um modelo consolidado, que não representa qualquer ilegalidade ou privilégio. Esses valores são percebidos como remuneração por desempenho, e submetem-se ao teto constitucional. A ideia de que se trata de “verba pública desviada” é não apenas incorreta, como desonesta.

Inclusive, uma vez que parte da remuneração dos membros da AGU tornou-se variável e dependente do desempenho (por meio dos honorários), a parcela fixa que esses profissionais recebem diretamente do governo ficou sensivelmente defasada em relação outras carreiras federais.

É importante lembrar que essa sistemática não é exclusividade da AGU. Ao contrário: a percepção de honorários é amplamente disseminada entre as advocacias públicas de todos os entes federativos — União, Estados e Municípios — e, em alguns locais, como São Paulo, essa prática existe há mais de 50 anos. Isso demonstra que não se trata de jabuticaba institucional, tampouco de uma inovação da União: é tradição da advocacia pública brasileira.

Mais que isso: a remuneração por performance é adotada por administrações públicas em todo o mundo. Trata-se de uma ferramenta legítima de gestão e incentivo, reconhecida por organismos internacionais e com impactos positivos na eficiência, na produtividade e na atração e retenção de talentos.

Sobre evasão de quadros e resultados, parece ponto comum que os órgãos ou unidades que trabalham e pensam gestão, seja na Administração Pública ou na esfera privada, tenham a preocupação em manter seus quadros com profissionais qualificados e dedicados, com a finalidade clara de eficiência e resultados.

Os dados demonstram a mesma equação na AGU: desde a adoção do modelo, a evasão de quadros caiu de 40% para 3,4%, enquanto a taxa de sucesso judicial passou de 56,1% para 68,8%. A arrecadação efetiva de valores principais para a União, via atuação dos membros da AGU, bate recordes sucessivos. Tudo isso sem prejuízo de políticas de redução de litígios e busca de soluções consensuais que reduzem o congestionamento judicial e trazem economia ao erário. Vale o destaque quanto à seriedade que a AGU trata o tema da consensualidade e da redução de litígios na AGU, tendo suas frentes, em termos de relevância e impacto, reconhecimento por entes públicos e privados do sistema de justiça.

A remuneração por performance reflete diretamente na motivação dos advogados públicos, tema que já foi objeto de pesquisas científicas. Parece intuitivo que servidores públicos mais motivados tendem a prestar melhores serviços públicos em favor da coletividade.

Estranhamente, embora os honorários sejam pagos há muito tempo a inúmeras procuradorias estaduais e municipais, ataques massivos ao pagamento dessa verba somente começaram a surgir com o pagamento aos membros da AGU – certamente o maior e um dos mais qualificados escritórios de advocacia do país – que invariavelmente contraria interesses muito poderosos ao defender ao União em juízo em processos milionários e bilionários.

Os honorários são parte da lógica da advocacia como função essencial à justiça — pública ou privada — e contam com apoio histórico da OAB e das carreiras jurídicas. Ao defenderem o Estado em juízo, os advogados públicos não atuam como meros braços do governo, mas como agentes autônomos da legalidade e da defesa do interesse público. A remuneração por êxito judicial é, portanto, compatível com o papel institucional e técnico dessas carreiras, e não um favor ou privilégio.

Inclusive, desde 1994, com a entrada em vigor do Estatuto da OAB, os honorários sucumbenciais deixaram de pertencer à parte e passaram a pertencer ao advogado, consolidando o entendimento de que essa verba constitui remuneração direta pelo trabalho técnico prestado. Não há razão para tratamento discriminatório contra os advogados públicos em geral, muito menos com os da advocacia pública federal em particular. Todos exercem função essencial à justiça.

A ideia de que tais valores competem com o orçamento da saúde ou da educação é outra distorção. Os honorários não saem do erário — são pagos pela parte vencida no processo. Em verdade, há diminuição do gasto orçamentário com a remuneração dos advogados públicos, podendo, tal “sobra”, justamente ser empregada em políticas públicas relevantes para toda a sociedade.

É importante sublinhar: honorários representam reconhecimento jurídico por trabalho técnico e de resultado na defesa da Administração Pública Federal e, pois, na defesa do patrimônio público. Defender o modelo é defender uma advocacia pública forte, valorizada, eficiente — e alinhada ao que há de mais moderno em gestão pública global.

Em tempos de ataque à institucionalidade, o resgate da verdade é mais que uma obrigação. É um dever republicano.

Dennys Casellato Hossne é advogado da União, especialista em Direito Processual Civil e mestre em Administração Pública pela FGV.
Débora Fernandes Marinho é advogada da União, especialista em Direto Púbico e pós-graduanda em Direitos da Mulher.
Pedro Vasques Soares é advogado da União, doutorando em Direito do Estado/ USP e mestre em Administração Pública FJP/MG.

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