
Fronteiras do Direito
Por Leonardo Branco, Letícia Menegassi Borges e Alexandre Evaristo Pinto
Um tema. Dois convidados. Discussões inteligentes com um pé no direito e outro não.
Quem produz
Leonardo Branco
Conselheiro Titular e Vice-Presidente de Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF).
Letícia Menegassi Borges
Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogada com experiência em Direito Tributário, atuando nas áreas consultiva e contenciosa.
Alexandre Evaristo Pinto
Doutorando em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo (USP).

Uso de celular por membro do tribunal do júri durante sustentação da defesa anula julgamento, decide ministro do STJ
O uso de celular por membro do tribunal do júri durante o julgamento pode comprometer a imparcialidade do veredicto e justificar a anulação da condenação. Com esse entendimento, o ministro Messod Azulay Neto, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), manteve decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) que anulou a sentença proferida em um julgamento popular.
O caso envolveu um dos jurados que foi flagrado mexendo no celular durante a sustentação oral da defesa, o que foi registrado em vídeo. Após a condenação do réu, a defesa interpôs recurso no TJ-MG alegando quebra da regra da incomunicabilidade dos jurados, prevista no artigo 466 do Código de Processo Penal. O tribunal mineiro reconheceu a irregularidade e anulou o julgamento.
O Ministério Público de Minas Gerais recorreu da decisão ao STJ. A Procuradoria alegou que a manifestação da defesa só ocorreu porque o resultado do julgamento foi desfavorável e sustentou que não houve comprovação de que o jurado estivesse utilizando o celular durante o julgamento.
Ao analisar o recurso, o ministro Messod Azulay rejeitou os argumentos do MP-MG. Em decisão monocrática, o relator destacou que a defesa apresentou o inconformismo de forma imediata e que há prova em vídeo da conduta do jurado.
Segundo o ministro, a conduta observada representa violação direta à garantia da plenitude de defesa. “A incomunicabilidade dos jurados constitui garantia fundamental do tribunal do júri, diretamente relacionada à imparcialidade e à independência dos julgadores leigos”, afirmou.
Azulay também frisou que a utilização do celular ocorreu em um momento decisivo do julgamento: “Como bem pontuou o tribunal de origem, o jurado utilizou o aparelho celular em momento significativo, em que as partes buscavam convencer os jurados acerca da procedência de suas razões. Ora, o uso do telefone durante a tréplica da defesa evidencia não apenas possível comunicação externa, mas também desatenção a momento crucial dos debates, comprometendo a própria plenitude de defesa, garantia constitucional do tribunal do júri”, concluiu.
Com a decisão, o processo deverá retornar ao tribunal do júri para realização de novo julgamento.

Moraes contraria PGR e autoriza prisão domiciliar para pastor preso por atos golpistas de 8 de janeiro
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou nesta semana a conversão da pena de Jorge Luiz dos Santos, pastor evangélico condenado pelos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, para prisão domiciliar. A decisão, publicada nesta terça-feira (15), contraria parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR), que havia defendido a manutenção do regime fechado.
Jorge Luiz está detido no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, e cumpre pena de 16 anos e seis meses de prisão pelos crimes de associação criminosa armada, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado e dano qualificado contra o patrimônio da União, com uso de violência e substância inflamável.
A defesa do pastor alegou hipertensão arterial grave e um quadro cardiovascular preocupante. No pedido apresentado no início de abril, advogados informaram que ele “está com sopro nível 6, o que faz com que sua pressão não seja controlada por medicamentos”.
O ministro Moraes já havia determinado, em novembro de 2023, a realização de avaliação por junta médica. De acordo com laudo elaborado pela Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal, embora não houvesse queixas de adoecimento agudo, Jorge apresentou “alterações do sistema cardiovascular com pressão arterial fora do limite e identificação de sopro sistólico em foco aórtico de grau seis”, audível inclusive sem o uso de estetoscópio.
Com base nos relatórios médicos, Moraes decidiu conceder a prisão domiciliar. O alvará de soltura foi expedido, assim como as notificações ao diretor da Papuda e à juíza da Vara de Execuções Penais do DF. Como condição para o benefício, Jorge Luiz deverá usar tornozeleira eletrônica, além de cumprir restrições como não utilizar redes sociais e não se comunicar com outros envolvidos nos ataques do 8 de janeiro. Visitas ficam restritas a advogados e parentes diretos — irmãos, filhos e netos —, sendo qualquer outra hipótese dependente de autorização do STF.
O nome do pastor estava incluído em uma lista de 20 pessoas enviada ao ministro Moraes pelo deputado Luciano Zucco (PL-RS), líder da oposição na Câmara. Em ofício datado de 9 de abril, Zucco reforçou pedidos por prisão domiciliar para acusados e condenados com problemas de saúde, filhos pequenos, ou que cuidam de pessoas com deficiência. Antes disso, o parlamentar já havia impetrado um habeas corpus coletivo no STF, que foi negado por incompatibilidade com a jurisprudência da Corte.
Zucco comemorou a decisão, afirmando que “nossa pressão surtiu efeito e agora ele finalmente está indo para casa, onde poderá receber um tratamento mais digno”. Para o deputado, “não houve golpe de Estado. No máximo, tivemos depredação de patrimônio público”, acrescentando que a oposição seguirá atuando para buscar liberdade para todos os envolvidos.
Além de Jorge Luiz dos Santos, outros três condenados pelos atos de 8 de janeiro foram autorizados por Moraes a cumprir prisão domiciliar nos últimos dias: Marco Alexandre Machado de Araújo, Cláudio Mendes dos Santos e Ramiro Alves da Rocha Cruz Junior.

Influenciador critica publicamente empresa que o contratou e é condenado a indenizar
A 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) condenou um influenciador digital a pagar R$ 15 mil por danos morais a uma farmácia de manipulação. A condenação ocorreu após o influenciador publicar críticas contra a empresa nas redes sociais, mesmo após ter firmado contrato de publicidade com ela.
O acordo foi assinado em janeiro de 2018, com o objetivo de divulgar os produtos da farmácia. O influenciador, que tem mais de um milhão de seguidores e atua nas áreas de saúde e esportes, deixou de cumprir o contrato, segundo a empresa. Em resposta, a farmácia suspendeu os pagamentos.
Na sequência, o influenciador publicou mensagens afirmando que só promove produtos que usa e nos quais acredita, alegando que a empresa queria que ele divulgasse itens desconhecidos. As declarações foram consideradas difamatórias pela farmácia, que recorreu à Justiça pedindo reparação por dano à imagem.
Em primeiro grau, o juiz rejeitou o pedido e entendeu que o influenciador apenas exerceu sua liberdade de expressão. No entanto, ao analisar o recurso da empresa, a relatora no TJ-MG, desembargadora Lílian Maciel, reverteu a decisão.
Para a magistrada, o problema não se restringe à ruptura do contrato, mas ao conteúdo das postagens feitas pelo influenciador, que atingiram a reputação da farmácia diante de um grande público. Ela destacou que o dano moral à pessoa jurídica se configura quando há abalo à honra objetiva, ou seja, à imagem e credibilidade da empresa perante terceiros.
“Daí porque o dano moral indenizável, no caso das pessoas jurídicas, notadamente as empresárias, é aquele que decorre do abalo de sua honra objetiva, isto é, aquilo que as pessoas de uma forma geral dela pensam com relação à reputação, credibilidade, confiabilidade e expectativa de eficiência no produto/serviço prestado”, afirmou.
Os desembargadores Luiz Gonzaga Silveira Soares e Fausto Bawden de Castro acompanharam o voto da relatora. Com isso, o influenciador foi condenado a indenizar a farmácia pelos prejuízos causados à sua imagem nas redes sociais.

‘Contraditório’: OAB-RJ manifesta preocupação com indicação de procurador lavajatista para TRF-2 que tentou criminalizar a advocacia
A Seccional Rio de Janeiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) manifestou “preocupação” com a inclusão do procurador da República Eduardo El Hage, ex-coordenador da Operação Lava Jato no RJ, na lista sêxtupla para o cargo de desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2).
“Como coordenador da ‘lava jato’ no Rio de Janeiro, Eduardo El Hage tentou criminalizar advogadas e advogados em razão do exercício de sua atividade profissional, classificando-os, inclusive, como ‘integrantes de organização criminosa’ – aberração que recebeu pronta, definitiva e justa repulsa do Supremo Tribunal Federal”, afirmou a OAB-RJ em nota.
A OAB-RJ lembrou que o Conselho Nacional do Ministério Público puniu Eduardo El Hage com suspensão de 30 dias e impedimento de ocupar cargos de confiança por cinco anos, por divulgar informações sigilosas à imprensa. O ministro do STF Luiz Fux suspendeu os efeitos da decisão.
“Parece contraditório e incompatível com a proeminência do cargo desejado que subsista na lista sêxtupla do Ministério Público Federal, dentre tantos procuradores e procuradoras altamente qualificados, membro que, na esteira de avaliação de seu principal órgão de controle, sequer poderia estar ocupando cargos de confiança dentro da própria instituição”, afirmou a OAB-RJ.
Eduardo El Hage é um dos seis procuradores do Ministério Público Federal (MPF) escolhidos para a lista sêxtupla para o cargo de desembargador federal do TRF-2 pelo Quinto Constitucional, que prevê vagas para advogados e representantes do MP nos tribunais. A escolha do novo desembargador federal do TRF-2 caberá ao presidente Lula.
“A OAB-RJ não pretende imiscuir-se nos processos internos de elaboração de listas do quinto constitucional. Todavia, entende que, tendo entre suas funções defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, possui legitimidade para manifestar-se sempre que identificar, em nome não só da advocacia, mas também da sociedade, circunstâncias que possam comprometer a confiança nas instituições e o compromisso público com a legalidade, a ética e os valores democráticos”, concluiu a nota da OAB-RJ.

Conselheiro federal por Goiás, Wandir Allan é nomeado presidente da Comissão Especial de Direito Eleitoral da OAB
O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB) designou o conselheiro federal por Goiás, Wandir Allan de Oliveira, como presidente da Comissão Especial de Direito Eleitoral. A nomeação foi feita pelo presidente nacional da OAB, Beto Simonetti, e pelo coordenador nacional de Comissões, Procuradorias e Projetos Estruturantes do CFOAB, Rafael Horn.
Com atuação destacada na área eleitoral, Wandir Allan traz para a comissão uma trajetória de compromisso com o fortalecimento do processo democrático e a valorização das prerrogativas da advocacia especializada nesse ramo do Direito. A comissão terá como missão desenvolver estudos técnicos, acompanhar a evolução da legislação eleitoral e propor medidas que garantam a segurança jurídica e a ética nas disputas eleitorais.
“Assumo a comissão em um momento importante, em que o debate público e as instituições exigem cada vez mais transparência, preparo técnico e compromisso com o Estado democrático de Direito. Com o novo Código Eleitoral em discussão no Senado, o Conselho Federal da OAB terá um papel fundamental nesse processo. É uma honra assumir essa responsabilidade e contribuir com a advocacia eleitoral em todo o país”, afirmou Wandir Allan.
A Comissão Especial de Direito Eleitoral deverá atuar em frentes como a análise de projetos de lei, o acompanhamento das eleições e a produção de pareceres técnicos, contribuindo com o aprimoramento da legislação e com o fortalecimento da advocacia que atua na seara eleitoral.

TRF-1 determina que universidade analise aproveitamento de disciplinas cursadas em outra instituição de ensino
O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) determinou que a Universidade de Brasília (UnB) proceda à análise do aproveitamento de disciplinas cursadas por uma estudante em uma instituição de ensino superior particular. A decisão considera a equivalência dos conteúdos programáticos e a compatibilidade das cargas horárias entre as disciplinas, e não a concomitância dos cursos, como havia sido alegado pela UnB.
A estudante havia solicitado o aproveitamento das disciplinas já cursadas, mas a UnB negou o pedido com base na Resolução CEPE 111/2002, que veda o aproveitamento de matérias cursadas em outras instituições de ensino superior de forma concomitante. No entanto, o desembargador federal Carlos Pires Brandão argumentou que a recusa não se sustentava, pois não havia sido realizada uma avaliação sobre a compatibilidade dos conteúdos ou das cargas horárias.
A decisão reitera a jurisprudência consolidada dos tribunais, que reconhece que a recusa ao aproveitamento de disciplinas deve ser fundamentada na incompatibilidade de conteúdos e não em aspectos administrativos.
Carlos Brandão também destacou que a interpretação restritiva da UnB prejudica os direitos do estudante, que estaria sendo forçado a cursar novamente matérias já aprovadas, o que é desproporcional e contrário aos princípios da razoabilidade. A decisão reflete uma mudança importante no entendimento sobre a autonomia das instituições de ensino superior e os direitos dos alunos, especialmente no contexto da educação superior no Brasil.
A decisão liminar também faz referência a um precedente do ministro do STF, Kassio Nunes Marques, que reconheceu o direito ao aproveitamento de disciplinas em situações de concomitância de cursos. O precedente foi estabelecido quando o ministro ainda atuava como desembargador federal do TRF-1, e fortalece a tese de que os direitos dos alunos devem ser preservados, mesmo que os cursos sejam cursados simultaneamente em diferentes instituições.
Em um momento de crescente discussão sobre a flexibilidade e os direitos dos estudantes no Brasil, a decisão do TRF1 tem repercussão importante. Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei 2502/22, que altera as regras para o aproveitamento de estudos, estabelecendo um prazo máximo de dez anos para o aproveitamento das disciplinas. O projeto está em análise na Câmara dos Deputados e pode impactar diretamente as normas sobre esse direito dos estudantes.
A decisão do TRF-1 pode abrir um novo caminho para os estudantes que enfrentam obstáculos nas universidades para validar os estudos realizados em outras instituições. A expectativa é de que as universidades repensem suas práticas e ofereçam mais transparência e flexibilidade na análise de pedidos de aproveitamento de disciplinas, contribuindo para a melhoria da formação acadêmica e a diminuição do tempo gasto pelos estudantes em suas graduações.
Apelação Cível n.º 1092564-92.2023.4.01.3400.